A decisão atende a pedido da psicóloga Rozangela
Alves Justino em processo aberto contra o Conselho Federal de Psicologia, que
aplicou uma censura à profissional por oferecer a terapia aos seus pacientes
Foto: Pixabay
O juiz federal da 14ª
Vara do Distrito Federal Waldemar Cláudio de Carvalho concedeu liminar que abre
brecha para que psicólogos ofereçam a terapia de reversão sexual, conhecida
como ‘cura gay’, tratamento proibido pelo Conselho Federal de Psicologia desde
1999. A decisão atende a pedido da psicóloga Rozangela Alves Justino em
processo aberto contra o colegiado, que aplicou uma censura à profissional por
oferecer a terapia aos seus pacientes. Segundo Rozângela e outros psicólogos
que apoiam a prática, a Resolução do C.F.P. restringia a liberdade científica.
Documento
“Sendo assim, defiro,
em parte, a liminar requerida para, sem suspender os efeitos da Resolução nº
001/1990, determinar ao Conselho Federal de psicologia que não a interprete de
modo a impedir os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional,
de forma reservada, pertinente à (re) orientação sexual, garantindo-lhes,
assim, a plena liberdade científica acerca da matéria, sem qualquer censura ou
necessidade de licença prévia por parte do C.F.P., em razão do disposto no art.
5º. inciso IX, da Constituição de 1988”, anota o magistrado.
Norma. Segundo a resolução 001/1999, do Conselho
Federal de Psicologia, ‘os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça
a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação
coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados’.
“os psicólogos não exercerão com eventos e serviços que proponham tratamento e
cura das homossexualidades”. Os autores da ação, que apoiam o tratamento de
reversão sexual, pediam que a norma fosse considerada inconstitucional por supostamente
‘restringir’ a liberdade científica.
“A fim de interpretar
a citada regra em conformidade com a Constituição, a melhor hermenêutica a ser
conferida àquela resolução deve ser aquela no sentido de não provar o psicólogo
de estudar ou atender àqueles que, voluntariamente, venham em busca de
orientação acerca de sua sexualidade, sem qualquer forma de censura preconceito
ou discriminação. Até porque o tema é complexo e exige aprofundamento
científico necessário”, anotou o magistrado, em ata de audiência no dia 15 de
setembro.
O magistrado não
considerou a norma que proíbe a cura gay como inconstitucional, mas disse
entender que os profissionais não podem se ser censurados por fornecer o
atendimento.
“Conforme pode ver, a
norma em questão, em linhas gerais, não ofende os princípios maiores da
Constituição. Apenas alguns de seus dispositivos, quando e se mal
interpretados, podem levar à equivocada hermenêutica no sentido de se
considerar vedado ao psicólogo realizar qualquer estudo ou atendimento relacionados
à orientação ou reorientação sexual. Digo isso porque a Constituição, por meio
dos já citados princípios constitucionais, garante a liberdade científica bem
como a plena realização da dignidade da pessoa humana, inclusive sob o aspecto
de sua sexualidade, valores esses que não podem ser desrespeitados por um ato
normativo infraconstitucional, no caso, uma resolução editada pelo C.F.P.”,
justificou o juiz.
Autores. Ao conceder a liminar o magistrado ainda
permite que os psicólogos autores da ação voltem a oferecer a terapia de
(re) orientação sexual. “O perigo da demora também se faz presente, uma vez que
, não obstante o ato impugnado datar da década de 90, os autores encontram-se
impedidos de clinicar ou promover estudos científicos acerca da (re) orientação
sexual, o que afeta sobremaneira os eventuais interessados nesse tipo de
assistência psicológica”.
O Conselho Federal de
Psicologia (CFP) puniu, com censura pública, em 2009, a psicóloga carioca
Rosângela Alves Justino, que oferecia terapia para ‘curar’ a homossexualidade
masculina e feminina.
De acordo com o
colegiado, ela infringiu resolução do Conselho Federal de Psicologia, de 22 de
março de 1999, na qual a entidade afirma que a homossexualidade “não constitui
doença, nem distúrbio e nem perversão”.
O CFP manteve,
naquele ano, a punição que tinha sido aplicada à psicóloga pelo Conselho
Regional de Psicologia do Rio de Janeiro.
Com a liminar, a
médica obteve parecer favorável da Justiça para fornecer o tratamento.
COM A PALAVRA, O
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA
A Justiça Federal da
Seção Judiciária do Distrito Federal acatou parcialmente o pedido liminar numa
ação popular contra a Resolução 01/99 do Conselho Federal de Psicologia (CFP)
que orienta os profissionais da área a atuar nas questões relativas à
orientação sexual. A decisão liminar, proferida nesta sexta-feira (15/9), abre
a perigosa possibilidade de uso de terapias de reversão sexual. A ação foi
movida por um grupo de psicólogas (os) defensores dessa prática, que representa
uma violação dos direitos humanos e não tem qualquer embasamento científico.
Na audiência de
justificativa prévia para análise do pedido de liminar, o Conselho Federal de
Psicologia se posicionou contrário à ação, apresentando evidências jurídicas,
científicas e técnicas que refutavam o pedido liminar. Os representantes do CFP
destacaram que a homossexualidade não é considerada patologia, segundo a
Organização Mundial de Saúde (OMS) – entendimento reconhecimento
internacionalmente. Também alertaram que as terapias de reversão sexual não têm
resolutividade, como apontam estudos feitos pelas comunidades científicas
nacional e internacional, além de provocarem sequelas e agravos ao sofrimento
psíquico.
O CFP lembrou, ainda,
os impactos positivos que a Resolução 01/99 produz no enfrentamento aos
preconceitos e na proteção dos direitos da população LGBT no contexto social
brasileiro, que apresenta altos índices de violência e mortes por LGBTfobia.
Demonstrou, também, que não há qualquer cerceamento da liberdade profissional e
de pesquisas na área de sexualidade decorrentes dos pressupostos da resolução.
A decisão liminar do
juiz federal Waldemar Cláudio de Carvalho mantém a integralidade do texto da
Resolução 01/99, mas determina que o CFP a interprete de modo a não proibir que
psicólogas (os) façam atendimento buscando reorientação sexual. Ressalta,
ainda, o caráter reservado do atendimento e veda a propaganda e a publicidade.
Interpretação – O que
está em jogo é o enfraquecimento da Resolução 01/99 pela disputa de sua
interpretação, já que até agora outras tentativas de sustar a norma, inclusive
por meio de lei federal, não obtiveram sucesso. O Judiciário se equivoca, neste
caso, ao desconsiderar a diretriz ética que embasa a resolução, que é
reconhecer como legítimas as orientações sexuais não heteronormativas, sem as
criminalizar ou patologizar. A decisão do juiz, valendo-se dos manuais
psiquiátricos, reintroduz a perspectiva patologizante, ferindo o cerne da
Resolução 01/99.
O Conselho Federal de
Psicologia informa que o processo está em sua fase inicial e afirma que vai
recorrer da decisão liminar, bem como lutará em todas as instâncias possíveis
para a manutenção da Resolução 01/99, motivo de humanos no Brasil orgulho de
defensoras e defensores dos direitos.
http://politica.estadao.com.br
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