domingo, 1 de outubro de 2023

Práxis política de Jesus

 

Práxis política de Jesus.

(Foto: Reuters/Jason Cohn)

Pedro Benedito Maciel Neto

Pedro Benedito Maciel Neto é advogado, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007.


Foi aos pobres que Jesus falou, afinal, ele propunha a mudança dos esquemas tradicionais que produziam opressão e exclusão.

“A certeza humanamente possível no trato com o Jesus histórico é a de que, ao nos ocuparmos com Ele, não estamos em ‘diálogo’ com um produto da fantasia, mas com um fenômeno histórico concreto”

Gerd Theissen e Annette Merz, in “O Jesus Histórico, um manual”


Meu pai sempre nos dizia que Jesus é um revolucionário, um subversivo, pois, “Ele mostra que um outro mundo é possível”. Numa conversa com um advogado, usei esse argumento, mas ele não gostou e ainda disse que revolucionários são “subversivos”, como se tal adjetivo contivesse significado negativo, quando na realidade os subversivos são aqueles que pregam ou executam ações visando à transformação da ordem estabelecida.

Fato é que o meu interlocutor reagiu e negou com veemência à minha afirmação sobre a existência de uma práxis revolucionária em Jesus, como se o meu argumento fosse um pecado capital. 

Lembrei de dois personagens: Tiradentes e Mandela, que, hoje, são tidos como heróis, mas já foram tratados como subversivos; ele respondeu dizendo: “são narrativas”.

A verdade é que Jesus não viveu no etéreo, viveu num mundo de conflitos num contexto sociopolítico delicado, de muita tensão, pois o rei Herodes I, o Grande, havia morrido no ano 4 a.C., e o seu reino foi dividido entre seus três filhos, na forma decidida pelo imperador romano Augusto, que não reconheceu o título de rei a nenhum dos três filhos de Herodes.

 A Herodes II Antipas, segundo filho de Herodes, o Grande, coube ser governador da Galiléia, conforme João, 6,1.23, e, aos outros dois filhos coube governar outras regiões; ele governou a Galileia até 39 d.C., quando foi deposto e exilado pelo imperador Tibério.

Havia muita confusão política; reinos foram divididos, governadores eram nomeados, depostos, exilados; foi um período de grande tensão política e profundas tensões estruturais entre judeus e gentios, cidade e campo, ricos e pobres, governantes e governados (pelo que se vê, o conflito de classes não é novidade ou “narrativa” marxista, comunista, socialista ou “petralha”).

Ao pregar a mudança da realidade, Jesus encontrou ouvintes entre aqueles que ansiavam por essa mudança, todos querem uma vida melhor para si e para os seus.

Um dado importante: de acordo com Valdevino José Ferreira, no seu “A DIMENSÃO POLÍTICA DA PRÁXIS DE JESUS NO EVANGELHO DE LUCAS”, o duplo sistema legal - romano e judaico – era motivo permanente de conflitos e, mesmo com certa autonomia, os judeus no Sinédrio - assembleia judia de anciãos da classe dominante, com funções políticas, religiosas, legislativas, jurisdicionais e educacionais - não davam conta de resolver os muitos conflitos e de compor interesses, pois a elite da época lutava por ampliar poder e privilégios, já a maioria das pessoas estavam empobrecidas pelo sistema.

Foi aos pobres que Jesus falou, foi o coração delas que ele tocou definitivamente, afinal, ele propunha a mudança dos esquemas tradicionais nas esferas políticas, sociais, religiosas, econômicas, entre outras, que produziam opressão e exclusão. 

Como aponta Valdevino José Ferreira, citando Albert Nolan, “no mundo judaico, não havia distinção entre política e religião. Questões como política, sociedade, economia e religião eram consideradas em termos de Deus e sua Lei. Naquela época, a unidade política se assemelhava à unidade econômica e religiosa. Internamente, a religião ditava as regras, os valores e as metas da política pela articulação e expressão da religião”.

Ou seja, religiosos e sua burocracia, eram também políticos, que usavam o divino como fonte de poder e força. 

Toda a trajetória de Jesus, assim como a sua morte, teve um profundo caráter político; sua morte é o ápice das consequências provocadas pelas tensões e conflitos de um homem carismático que veio do campo, anunciando uma mudança cósmica que transformaria inclusive o Templo com os detentores e defensores do status quo, ou seja, toda a pregação de Jesus possuía aspectos politicamente explosivos, com grandes implicâncias para a época.

Negar esse contexto é negar o próprio evangelho. 

Mas e a tal práxis revolucionária ou política de Jesus? 

Entendendo o funcionamento da economia daquela época, entenderemos o peso político que tiveram as críticas de Jesus a um Estado teocrático, um tempo em que qualquer comportamento religioso se tornava um comportamento político.

Na época de Jesus a vida do povo era baseada na economia e na política do Império Romano, assim como a estrutura social. 

A elite era composta pelos representantes do Império, generais do exército, latifundiários, grandes comerciantes e os que possuíam a cidadania romana.

Na classe média estavam os artesãos, que se dedicavam à construção de ferramentas para o exército, à agricultura, ao transporte e à moradia, ou seja, José, pai adotivo de Jesus, era de classe média.

E havia os operários, quase todos de origem camponesa, que trabalhavam nas grandes obras financiadas pelo Império, mas a maioria da população era composta de escravos, verdadeira mercadoria humana a serviço da ganância e da ambição do Império e de seus aliados.

Jesus era crítico a esse sistema piramidal, escravocrata, que concentrava poder e garantia privilégios; Jesus apontou a possibilidade da construção de um outro mundo através da práxis política, ou seja, ele propôs incluir os excluídos, propôs uma realidade igualitária e de justiça.

Em todo Evangelho de Lucas vê-se a opção de Jesus pelos pobres e o tema da libertação do povo é recorrente.

Ele propõe uma práxis política para transformar em uma sociedade de incluídos, de livres e de iguais, onde reine a justiça e a paz, a sociedade então marcada pela corrupção, pela má distribuição de riqueza, uma sociedade em que a maioria vivia na miséria, em uma sociedade de incluídos, de livres e de iguais, onde reine a justiça e a paz.

É nisso que acredito.

Fonte.Brasil247.com


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