Como se defender da grosseria do seu chefe
Saiba o que leva um profissional a agir de forma rude e como lidar com ele
Raro encontrar alguém que não tenha passado - ou esteja passando - por alguma situação constrangedora no ambiente de trabalho. O pior exemplo disso talvez seja a aspereza do chefe, que esbraveja aos quatro ventos e deixa os funcionários sem saber como agir diante de tanta cara feia. O que tem espaço no ambiente de trabalho? Até que ponto aceitar? Quando isso se transforma em assédio moral?
Para começar, não há nada no mundo que justifique uma grosseria do chefe no ambiente de trabalho. Pelo menos é isso que pensa André Bocater, Diretor Executivo da Thomas Case & Associados. O consultor diz, no entanto, que podemos tentar entender as motivações que existem por trás desse tipo de atitude. "Vivemos hoje em uma sociedade onde a pressão por resultados e o tempo cada vez mais escasso fazem parte do cotidiano e é natural que algumas pessoas reajam de forma mais explosiva", explica. É claro que quando se torna algo recorrente e o gestor já não consegue administrar a pressão do dia a dia, descarregando sua raiva nos subordinados, deve recorrer à ajuda de um terapeuta ou coaching, para que não seja prejudicado - e não prejudique ninguém - profissionalmente.
Mas, quando essa falta de educação do chefe vira assédio moral? Ricardo Pereira de Freitas Guimarães, mestre em Direito do Trabalho e professor da pós-graduação da PUC-SP, explica que o assédio moral ocorre através de uma série de condutas reiteradas que visam reduzir a confiança do empregado em sua capacidade profissional. "Essas condutas podem ser desde a ausência de convite para reuniões que sempre era convidado, simples balançar de cabeça de forma negativa quando determinado empregado emite sua opinião, desprezo quanto às ideias apresentadas pelo empregado, e até em alguns casos, o próprio isolamento do empregado em relação ao seu trabalho e de seus pares", diz o advogado.
E olha só que grave: segundo Ricardo, a falta de educação numa única oportunidade mesmo sem esse desejo de menosprezar a qualificação e produtividade profissional, ou seja, sem a real intenção de forçar uma queda na autoestima do empregado, pode gerar um dano moral que, dependendo da intensidade, irá ter como resultado uma indenização por dano moral.
O que é importante deixar claro é que o assédio moral não necessariamente ocorre entre superior hierárquico e seus subordinados. Muitas vezes pode ocorrer entre pares com idêntica função na empresa e outras vezes, inclusive, assédio entre um grupo de empregados e seu superior. Então, como lidar com a questão? "Acredito que atitudes rudes sem maldade são administráveis. Porém, as atitudes rudes com intenção costumam contaminar toda a equipe. Quando isso acontece com colegas, é importante evitar ao máximo o atrito e limitar-se ao relacionamento no campo profissional. Quanto tal atitude está relacionada à chefia, a situação torna-se mais delicada", pondera André.
O diálogo franco é sempre a solução mais indicada. Caso não haja forma de entrar em um entendimento através de uma conversa, o melhor é denunciar. "Os profissionais devem avaliar as causas da grosseria. Quando ocorre de forma pontual, deve-se tentar entender o que provocou aquilo. Mas se a situação é recorrente, se o profissional sente-se acuado ou até mesmo a grosseria está relacionada a assédio moral, não vejo problema em o profissional denunciar", aconselha André.
Mas o funcionário geralmente fica bastante receoso de tomar uma medida legal e ser demitido, ou, ainda pior, ficar "marcado" no mercado de trabalho. Por isso, tolera atitudes grosseiras. "A maior dificuldade do empregado é provar que ocorreu o assédio. Essa nos parece a maior razão para que não se procure a Justiça nos vários casos em que ele ocorre", esclarece Ricardo, completando: "No mercado de hoje, em razão das inúmeras oportunidades, difícil o empregado ficar marcado. Na verdade, isso se trata de uma lenda", diz.
O problema é que esse tipo de comportamento de alguém da equipe - seja chefe ou não - pode ocasionar danos para todo mundo. Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos constatou que aproximadamente 70% dos pedidos de demissão não estão relacionados à cultura da empresa ou falta de chance de crescimento. O motivo está ligado aos relacionamentos complicados com chefes imediatos. E, se não há jeito de se entender com a chefia, é o caso de se avaliar a troca de área ou até mesmo de empresa. "Vale ressaltar que, em ambos o casos, o profissional deve tentar manter a calma, já que partir para o confronto poderá agravar o cenário", aconselha o especialista.
O profissional também deve cogitar mudar de emprego quando ele sentir, por exemplo, que os comportamentos agressivos vindos da chefia estão prejudicando o seu desempenho profissional, ou até mesmo quando a situação minar a sua disposição para o trabalho. De acordo com André, muitas vezes, situações do tipo fazem com que os profissionais percam a vontade até de ir para o escritório ou realizar as tarefas do dia a dia.
Mesmo depois de toda essa conversa você ainda não sabe identificar se passa por situações de exposição a maus-tratos do chefe? Então aqui estão alguns exemplos - das mais sutis às mais explícitas. Veja:
- Um gesto "balançar de cabeça no sentido negativo", desde que reiterado quando manifestada uma opinião sobre um trabalho em reunião;
- Um sorriso carregado de cinismo (reiteradas vezes) por um colega de trabalho;
- O franzir da testa reiteradamente como atitude de reprimenda a uma ideia lançada;
- A retirada aos poucos de funções que antes eram delegadas para determinado empregado, como passar a não convidar determinado empregado para frequentar reuniões que outrora participava; retirada de instrumentos de trabalho; transferências de setor; requerimento de realização de trabalhos que não possuem qualquer utilidade para a empresa; requerer trabalhos e metas impossíveis de cumprimento;
- Constantes "brincadeiras", principalmente àquelas de péssimo gosto. Nesse contexto, temos apelidos vinculados ao trabalho como "homem-tartaruga" para indicação da lentidão de um funcionário no processo produtivo;
- Prêmio para o pior funcionário do mês, com a exibição da foto do funcionário pelo mês todo na sala de reunião de equipe de vendas ou o apelido de "homem-perfeito" para o funcionário detalhista;
- Respostas duras na frente dos outros colaboradores;
- Nunca elogiar e só olhar o lado ruim;
- Roubar as suas ideias ou não dar o devido crédito para elas;
- Gritar com os colaboradores;
- Tentar prejudicar algum colaborador.
Muitas vezes os maus-tratos não são evidentes e se camuflam em situações do dia a dia, por meio das chamadas retaliações. A dica para esses casos é avaliar a situação para entender se o chefe de fato tentou prejudicá-lo. O conselho dos especialistas é manter a calma e tentar resolver da melhor forma possível. "Nunca se deve elevar o tom da voz e é preciso manter ao máximo a tranquilidade, já que o confronto tende a agravar ainda mais a situação", sinaliza.
Para Ricardo, o assédio moral é muito perigoso para as empresas, sob pena de levar a bancarrota uma imagem construída ao longo do tempo, além de eventual condenação judicial pela prática. "É preciso a criação de mecanismos internos e de políticas de liderança com responsabilidade no seio da empresa, compreendendo as diferenças existentes entre seus empregados", diz. Só assim a empresa mantém sua imagem e um ambiente produtivo que tem como consequência o sucesso econômico. E o que dizer do empregado? Ah, esse mantém a saúde intacta. Porque situações como essas estressam. E como estressam!
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