Sam Alves e o ‘complexo de vira-lata’
Por: Eduardo Nunomura
Sam Alves e sua versão bilíngue de "Hallelujah", de Leonard Cohen - Fotos The Voice Brasil/TV Globo
Sam Alves e sua versão bilíngue de “Hallelujah” – Fotos The Voice Brasil/TV Globo
Sam Alves é a vitória do “complexo de vira-latas”, cravou um tuite que pipocou instantes depois do resultado de The Voice Brasil. A cantora Zélia Duncan fez troça: “A real Brazilian Singer sings in English, right? Rs good luck, Sam.” Também no Twitter, o publicitário Michel Lent, da agência Pereira & O’Dell Brasil, criticou: “Rejeitado nos The VoiceEUA, recauchutado no @TheVoiceBrasil.” O jornalista Artur Xexéo foi mais longe: “Na minha humilde opinião, Sam Alves era o pior dos quatro.”
O escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues cunhou a expressão “complexo de vira-latas” para falar do trauma dos brasileiros com a derrota na Copa de 1950, mas que se espraiou para muito além do gramado do Maracanã. “Por ‘complexo de vira-lata’ entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”, escreveu. Algumas das reações pouco amistosas sobre o vitorioso, Sam Alves, e o programa, The Voice Brasil, seguiram nessa linha.
Nascido em Fortaleza, Sam Alves, de 24 anos, cresceu e mora até hoje nos Estados Unidos. Foi lá que ele foi eliminado da versão americana, em que nenhum dos técnicos, Adam Levine, Blake Shelton, Usher e Shakira, viraram a cadeira. No Brasil, viraram os quatro jurados, Claudia Leitte, Carlinhos Brown, Daniel e Lulu Santos. Na ocasião, a escolha da cantora baiana para ser sua treinadora provou-se acertada. Sam Alves contou com a generosidade dela na apresentação da grande final.
No número solo, o primeiro da noite, Sam Alves primeiro cantou “Hallelujah”, de Leonard Cohen, em duas partes, a primeira numa tropega versão em português e a outra com a letra em inglês no estilo gospel. O site da revista Veja, ao anunciar que não havia “surpresas” na vitória de Sam Alves, disse que “Aleluia” é “uma das canções mais comuns em cultos nos Estados Unidos – e, não por coincidência cantada também este ano por um dos candidados (sic) do The Voice USA”. Tsc, tsc, tsc.
Sam Alves teve 43% dos 29 milhões de votos do público, num processo de votação em que não se fala de auditoria. Leva para casa um carro e uma poupança de 500 mil reais, além de assinar um contrato com a gravadora Universal Music. Para comemorar a vitória, ele cantou “When I Was Your Man”, de Bruno Mars, “of course”. Mas ele não foi o único a cantar uma versão americanizada. Daniel, na parceria com Rubens Daniel, cantou “Bridge Over Troubled Water”, de Paul Simon e um dos maiores sucessos de Simon and Garfunkel.
Rubens Daniel teve melhor sorte que Pedro Lima, inúmeras vezes elogiado por todos os técnicos na temporada. Mas na apresentação final fez as vezes de “backing vocal” e foi eclipsado por Lulu Santos, que parecia querer disputar o tempo todo com os outros técnicos. Lulu não entendeu que um dia ele já fora a Voz do Brasil, hoje não é mais.
A bela e talentosa paraibana Lucy Alves, do time de Carlinhos Brown, foi outra preterida pelo público. Tocou “De Volta Pro Aconchego”, de Dominguinhos, acompanhada da família, que forma a banda Clã Brasil. Podia ter sido consagrada na e pela TV Globo como mais uma sanfoneira famosa, da mesma envergadura de Adelaide Chiozzo – alguém se lembra de
“Beijinho Doce”? Mas parece que a ordem do dia não era valorizar a cultura brasileira. Am I wrong, #TheVoiceBrazil?
Sobre o autor:
Editor de FAROFAFÁ, jornalista e mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo.
Marmelada.
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