terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Lésbicas são violadas na Africa do Sul

A violencia contra as lésbicas da Africa do Sul é uma afronta aos direitos humanos. Silencio = á morte

ÁFRICA DO SUL- MARÇO 2009

ÁFRICA DO SUL- MARÇO 2009 Lésbicas violadas como castigo e correcção de comportamento JN de 13 de Março Um estudo da organização não governamental ActionAid afirma que um grande número de lésbicas sul-africanas é sujeito a "violações correctivas", um castigo pela orientação sexual e para corrigir o comportamento considerado desviante. Só na Cidade do Cabo dez lésbicas são violadas em média todas as semanas por atacantes que classificam o crime de "violação correctiva". Conclusão do trabalho da Organização Não-Governamental (ONG) ActionAid, apresentado, esta terça-feira, em Joanesburgo, na África do Sul. "A chamada violação correctiva é mais uma grotesca manifestação de violência contra as mulheres, que constitui a mais comum violação dos direitos humanos no mundo actualmente", refere o relatório do ActionAid, uma ONG internacional, que desde 1972 se dedica ao combate à pobreza no Mundo. Apesar de a Constituição da África do Sul consagrar direitos iguais para todos os cidadãos, independentemente da orientação sexual, o país enfrenta um grave problema de preconceitos culturais e sociais que origina actos criminosos contra homossexuais, de acordo com a ONG responsável pelo estudo. Os autores do trabalho referiram que o número de violações na África do Sul ascende a 500 mil por ano, um dos mais altos índices mundiais e as lésbicas, em particular, são alvo, desde há muito de "violações correctivas" por homens que pensam que assim as "curam" das tendências homossexuais. Para agravar a situação, apenas um em cada 25 homens acusados de violação nos tribunais sul-africanos é condenado pelo crime, denunciou Zanele Twala, uma das autoras do estudo. No prefácio do estudo, o presidente da Comissão Sul-Africana dos Direitos Humanos, Jody Kollapen, afirma que as conclusões obrigam o sistema de justiça a repensar a definição de "crimes de ódio". "Os crimes de ódio desta natureza requerem acções decisivas do sistema de forma a que os responsáveis sejam punidos por eles", refere Kollapen. O estudo cita uma organização de defesa dos direitos dos homossexuais na Cidade do Cabo, segundo a qual 31 lésbicas foram assassinadas na última década naquela cidade e arredores, tendo apenas sido condenado um dos implicados em todos os crimes. ESPANHA - MARÇO 2009

Lésbicas violadas como castigo e correcção de comportamento

ÁFRICA DO SUL- MARÇO 2009 Lésbicas violadas como castigo e correcção de comportamento JN de 13 de Março Um estudo da organização não governamental ActionAid afirma que um grande número de lésbicas sul-africanas é sujeito a "violações correctivas", um castigo pela orientação sexual e para corrigir o comportamento considerado desviante. Só na Cidade do Cabo dez lésbicas são violadas em média todas as semanas por atacantes que classificam o crime de "violação correctiva". Conclusão do trabalho da Organização Não-Governamental (ONG) ActionAid, apresentado, esta terça-feira, em Joanesburgo, na África do Sul. "A chamada violação correctiva é mais uma grotesca manifestação de violência contra as mulheres, que constitui a mais comum violação dos direitos humanos no mundo actualmente", refere o relatório do ActionAid, uma ONG internacional, que desde 1972 se dedica ao combate à pobreza no Mundo. Apesar de a Constituição da África do Sul consagrar direitos iguais para todos os cidadãos, independentemente da orientação sexual, o país enfrenta um grave problema de preconceitos culturais e sociais que origina actos criminosos contra homossexuais, de acordo com a ONG responsável pelo estudo. Os autores do trabalho referiram que o número de violações na África do Sul ascende a 500 mil por ano, um dos mais altos índices mundiais e as lésbicas, em particular, são alvo, desde há muito de "violações correctivas" por homens que pensam que assim as "curam" das tendências homossexuais. Para agravar a situação, apenas um em cada 25 homens acusados de violação nos tribunais sul-africanos é condenado pelo crime, denunciou Zanele Twala, uma das autoras do estudo. No prefácio do estudo, o presidente da Comissão Sul-Africana dos Direitos Humanos, Jody Kollapen, afirma que as conclusões obrigam o sistema de justiça a repensar a definição de "crimes de ódio". "Os crimes de ódio desta natureza requerem acções decisivas do sistema de forma a que os responsáveis sejam punidos por eles", refere Kollapen. O estudo cita uma organização de defesa dos direitos dos homossexuais na Cidade do Cabo, segundo a qual 31 lésbicas foram assassinadas na última década naquela cidade e arredores, tendo apenas sido condenado um dos implicados em todos os crimes. ESPANHA - MARÇO 2009

Tony Blair critica vaticano em relação aos homossexuais

EUROPA - ABRIL 2009 Tony Blair critica atitude do Vaticano em relação aos homossexuais O ex-primeiro-ministro Tony Blair considerou ontem que o Vaticano devia "repensar" as suas posições "inflexíveis" em relação aos homossexuais. "Precisamos de uma nova postura onde o conceito de uma evolução das atitudes faça parte da disciplina com a qual se pensa a fé religiosa", numa entrevista à "Attitude", uma revista destinada a um público gay. Blair, que se converteu ao catolicismo em 2007, acredita que existe uma "diferença geracional" significativa entre os líderes da Igreja Católica e os membros das congregações. "Há aqui uma enorme diferença geracional", disse quando lhe foi pedido para comentar as declarações de Bento XVI que, ainda enquanto cardeal, definira a homossexualidade como uma "disfunção objectiva", escreveu a Associated Press. "(...) Se for a uma Igreja num domingo (...) ficará surpreendido com a abertura de espírito das pessoas", acrescentou, sugerindo que a maioria dos católicos não concorda com a posição oficial da Igreja e deixando entender que estas declarações não são um ataque à Igreja nem a Bento XVI. "Existem muitas e grandiosas coisas que a Igreja Católica faz, e há imensas coisas fantásticas que este Papa defende", referiu. Tony Blair converteu-se ao catolicismo em 2007, depois de ter abandonado o cargo de primeiro-ministro do Reino Unido. Em 2008 criou a Tony Blair Faith Foudation, uma fundação com o objectivo de combater o fanatismo religioso, organizar grupos de fé para ajudar na luta contra a pobreza e informar pessoas em todo o mundo acerca de outras religiões que não a sua. Jornal Público

Iraque continua mantando os seus gays

IRAQUE - AGOSTO 2009 Campanha de ataques, assassínios e tortura contra gays no Iraque Milícias viram as suas atenções para os costumes, diz a Human Rights Watch. Haverá centenas de vítimas de perseguição Milícias no Iraque estão a levar a cabo uma campanha cada vez mais violenta contra quem seja suspeito de comportamento homossexual, com uma campanha de assassínios, raptos e tortura que começou no início deste ano. mais »

Prefeita de Houston é lésbica

Houston elege uma 'mayor' homossexual DN de 15 Dezembro A quarta maior cidade dos EUA elegeu uma mayor assumidamente homossexual. Annise Parker, independente, venceu a segunda volta das eleições municipais de Houston no Texas por 53,6% contra o rival democrata, Gene Locke, após uma campanha quente dominada pela retórica antigay. Activistas anti-homossexualidade e grupos religiosos inundaram a cidade com panfletos a condenar o comportamento sexual de Parker. Do outro lado, organizações gays de todos EUA recolheram dinheiro para Parker. Na hora da vitória, a ex-tesoureira - que garantia a clareza das contas da cidade - disse: "Houston abriu a porta da história. Esta eleição mudou o mundo para a comunidade gay."

casamento gay em Nova Iorque

Assembleia do estado de Nova Iorque aprova igualdade nos casamentos Público de 13 de Maio A assembleia de Nova Iorque aprovou ontem à noite o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Se a polémica lei passar no senado, Nova Iorque poderá tornar-se o sexto Estado norte-americano a legalizar as uniões homossexuais. O diploma foi aprovado por 89 votos a favor e 52 contra, com muitos os congressistas a mudarem o seu sentido de voto em relação à discussão do mesmo diploma, em 2007. Entre os que apoiaram a lei estão cinco eleitos republicanos. "Eles merecem ter os mesmos direitos e a mesma capacidade para partilhar o seu amor", explicou ao "New York Times" a republicana Janet Duprey, revelando que foi um casal lésbico que vive na sua rua a convencê-la a mudar o seu sentido de voto. Ainda antes de a assembleia votar a lei, já os defensores e opositores da legalização do casamento homossexual dirigiam as suas atenções para o senado de Albany, a quem caberá a decisão final. Segundo o NYT, os apoiantes dos direitos dos homossexuais têm já preparados vários spots publicitários, que serão passados nos círculos dos senadores cuja intenção de voto ainda não é certa. Por seu lado, os conservadores e dirigentes religiosos multiplicaram já os encontros com os senadores estaduais e avisaram os eleitos pelo Partido Republicano que deixarão de contar com o seu apoio caso votem a favor da legislação. Maine foi o último Estado a aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, no passado dia 6, juntando-se ao Massachusetts, Connecticut, Iowa e Vermont, enquanto outros estados aprovaram emendas constitucionais para proibir expressamente a união legal de casais homossexuais.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Foto da minha infância

Eu posso confessar a todos vocês que realmente tive uma boa infância, coom os meus pais preocupados em oferecer a melhor condição de vida para mim e meus irmãos. Eu pesquei, nas lagoas, subi nos pes de caju, catei ovos de galinha d água, gostava muito de andar na chuva, mas em determinada época da minha infância eu pareia uma criança autista. Porque eu me isolava, adorava sair andando da minha cidade (Areial) para o sitio da casa dos meus avós. Adorava o final do dia da sexta feira para sair correndo da escola, trocar de roupa e sair para o sitio dos meus avós. Nesta foto apareço pescando piabas no tanque de pedra, que ficava localizado a uma lagoa.

POESIA DE DOSTOIÉVSKI

DOSTOIÉVSKI Os Descrentes Nunca encontrei um descrente, apenas desvairados inquietos... é assim que é melhor tratá-los. São pessoas diferentes, não se percebe bem o que são: tanto os grandes como os pequenos, os ignorantes como os cultos, mesmo a gente da classe mais simples, tudo neles é desvario. Porque passam a vida a ler e a interpretar e depois, fartos da doçura livresca, continuam perplexos e não conseguem resolver nada. Há quem se disperse, de maneira que não consegue atentar em si mesmo. Há quem seja rijo como pedra, mas no seu coração vagueiam sonhos. Há também o insensível e fútil que só quer gozar e ironizar. Há quem só tire dos livros florzinhas, e mesmo elas consoantes à sua opinião, e há nele desvario e falta de perspicácia. E digo mais: há muito tédio. O homem pequeno é necessitado, não tem pão, não tem com que sustentar os filhos, dorme na palha áspera, mas tem o coração leve e alegre; é pecador e malcriado, mas mantém na mesma o coração alegre. E o homem grande farta-se de comer e beber, senta-se num montão de ouro, mas tem sempre a mágoa no coração. Há quem domine as ciências mas não se livre do tédio. Penso eu, então, que quanto maior a inteligência, maior é o tédio. Além disso, vede: andam a ensinar a gente desde o princípio dos tempos, mas o que lhes ensinaram para que o mundo fosse a mais bela e alegre habitação, recheada de todas as felicidades? E digo também: não têm decoro, nem sequer o desejam; pereceram todos, e todos louvam o seu perecimento, sem pensarem em virar-se para a única verdade (ora, viver sem Deus é um castigo, mais nada). Resultado: amaldiçoamos o que nos ilumina e não o sabemos. Que sentido tem viver assim? O homem que não venera não vive, um homem assim não suportará a si mesmo, nenhum homem. Se rejeitar Deus, venerará o ídolo... de madeira, de ouro, de pensamento. Estes são idólatras, não são descrentes: é assim que devem ser chamados. Mas, então, não existem descrentes? Sim, há quem seja na verdade descrente, e são esses os mais assustadores, porque trazem sempre o nome de Deus na boca. Ouvi falar dessa gente por mais de uma vez, mas nunca a encontrei. Existe, meu amigo, e acho que deve existir. FIÓDOR MIKHAILOVITCH DOSTOIÉVSKI, em O adolescente Enviado pelo amigo Joaquim Gama Odeio os indiferentes. Como Friederich Hebbel acredito que "viver significa tomar partido". Não podem existir os apenas homens, estranhos à cidade. Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão, e partidário. Indiferença é abulia, parasitismo, covardia, não é vida. Por isso odeio os indiferentes. A indiferença é o peso morto da história. É a bala de chumbo para o inovador, é a matéria inerte em que se afogam freqüentemente os entusiasmos mais esplendorosos, é o fosso que circunda a velha cidade e a defende melhor do que as mais sólidas muralhas, melhor do que o peito dos seus guerreiros, porque engole nos seus sorvedouros de lama os assaltantes, os dizima e desencoraja e às vezes, os leva a desistir de gesta heróica. A indiferença atua poderosamente na história. Atua passivamente, mas atua. É a fatalidade; e aquilo com que não se pode contar; é aquilo que confunde os programas, que destrói os planos mesmo os mais bem construídos; é a matéria bruta que se revolta contra a inteligência e a sufoca. O que acontece, o mal que se abate sobre todos, o possível bem que um ato heróico (de valor universal) pode gerar, não se fica a dever tanto à iniciativa dos poucos que atuam quanto à indiferença, ao absentismo dos outros que são muitos. O que acontece, não acontece tanto porque alguns querem que aconteça quanto porque a massa dos homens abdica da sua vontade, deixa fazer, deixa enrolar os nós que, depois, só a espada pode desfazer, deixa promulgar leis que depois só a revolta fará anular, deixa subir ao poder homens que, depois, só uma sublevação poderá derrubar. A fatalidade, que parece dominar a história, não é mais do que a aparência ilusória desta indiferença, deste absentismo. Há fatos que amadurecem na sombra, porque poucas mãos, sem qualquer controle a vigiá-las, tecem a teia da vida coletiva, e a massa não sabe, porque não se preocupa com isso. Os destinos de uma época são manipulados de acordo com visões limitadas e com fins imediatos, de acordo com ambições e paixões pessoais de pequenos grupos ativos, e a massa dos homens não se preocupa com isso. Mas os fatos que amadureceram vêm à superfície; o tecido feito na sombra chega ao seu fim, e então parece ser a fatalidade a arrastar tudo e todos, parece que a história não é mais do que um gigantesco fenômeno natural, uma erupção, um terremoto, de que são todos vítimas, o que quis e o que não quis, quem sabia e quem não sabia, quem se mostrou ativo e quem foi indiferente. Estes então zangam-se, queriam eximir-se às conseqüências, quereriam que se visse que não deram o seu aval, que não são responsáveis. Alguns choramingam piedosamente, outros blasfemam obscenamente, mas nenhum ou poucos põem esta questão: se eu tivesse também cumprido o meu dever, se tivesse procurado fazer valer a minha vontade, o meu parecer, teria sucedido o que sucedeu? Mas nenhum ou poucos atribuem à sua indiferença, ao seu cepticismo, ao fato de não ter dado o seu braço e a sua atividade àqueles grupos de cidadãos que, precisamente para evitarem esse mal combatiam (com o propósito) de procurar o tal bem (que) pretendiam. A maior parte deles, porém, perante fatos consumados prefere falar de insucessos ideais, de programas definitivamente desmoronados e de outras brincadeiras semelhantes. Recomeçam assim a falta de qualquer responsabilidade. E não por não verem claramente as coisas, e, por vezes, não serem capazes de perspectivar excelentes soluções para os problemas mais urgentes, ou para aqueles que, embora requerendo uma ampla preparação e tempo, são todavia igualmente urgentes. Mas essas soluções são belissimamente infecundas; mas esse contributo para a vida coletiva não é animado por qualquer luz moral; é produto da curiosidade intelectual, não do pungente sentido de uma responsabilidade histórica que quer que todos sejam ativos na vida, que não admite agnosticismos e indiferenças de nenhum gênero. Odeio os indiferentes também, porque me provocam tédio as suas lamúrias de eternos inocentes. Peço contas a todos eles pela maneira como cumpriram a tarefa que a vida lhes impôs e impõe quotidianamente, do que fizeram e sobretudo do que não fizeram. E sinto que posso ser inexorável, que não devo desperdiçar a minha compaixão, que não posso repartir com eles as minhas lágrimas. Sou militante, estou vivo, sinto nas consciências viris dos que estão comigo pulsar a atividade da cidade futura que estamos a construir. Nessa cidade, a cadeia social não pesará sobre um número reduzido, qualquer coisa que aconteça nela não será devido ao acaso, à fatalidade, mas sim à inteligência dos cidadãos. Ninguém estará à janela a olhar enquanto um pequeno grupo se sacrifica, se imola no sacrifício. E não haverá quem esteja à janela emboscado, e que pretenda usufruir do pouco bem que a atividade de um pequeno grupo tenta realizar e afogue a sua desilusão vituperando o sacrificado, porque não conseguiu o seu intento. Vivo, sou militante. Por isso odeio quem não toma partido, odeio os indiferentes.

poemas de Vladimir Maiakóvski

Retorna para Pensadores Vladimir Maiakóvski BIOGRAFIA: Em 1906, após a morte de seu pai, muda-se com a família para Moscou. Aos 15 anos ingressa no Partido Bolchevique e é preso duas vezes, sendo que na última permanece onze meses encarcerado, quando aproveita para leitura de todas as obras clássicas. Em 1910, ingressa na Escola de Belas Artes, de onde é expulso quatro anos depois, quando já se encontra ligado ao movimento futurista. Era o expoente de uma geração em busca de uma estética que captasse a profundidade daquelas inquietações russas. A partir da Revolução de 1917 sua atividade literária se intensifica unido a atividade política. Participa das comissões de literatura, pintura e cinema. Começa a ser tachado pelos burocratas do Partido de "incompreensível para as massas". Maiakóvski busca demonstrar seu engajamento fazendo cartazes e poemas de exaltação ao Regime Soviético. Nos últimos três anos de vida, levou seus versos a mais de 180 mil pessoas, em conferências e recitais por várias cidades. Nunca aceitou a imposição de escrever o vazio óbvio como os poetas proletários insistiam. Dizia "vangloriam-se alguns do fato de a nossa leitura ser florida como um jardim". Suicidou-se talvez pela falta de perspectivas que via para a sua arte, talvez pelos problemas de saúde, estava com a garganta abalada e percebia que não poderia recitar mais, talvez pelos relacionamentos amorosos infelizes. Além das poesias e roteiros dos filmes escreveu as peças teatrais Mistério Bufo (1918 e 1920) e O Percevejo (1929) dirigidas por Meyerhold, Eu, Vladimir Maiakóvski (1913) e Os Banhos (1930). ---------------------------------------------- CITAÇÕES "A poesia é uma forma de produção. Dificílima, complexíssima, porém produção." * "Sem forma revolucionária não há arte revolucionária." * "Eu não forneço nenhuma regra para que uma pessoa se torne poeta e escreva versos. E, em geral, tais regras não existem. Chama-se poeta justamente o homem que cria estas regras poéticas." * "Traduzir poemas é tarefa difícil, especialmente os meus. (...)Uma outra razão da dificuldade da tradução de meus versos vem de que introduzo nos versos a linguagem quotidiana, falada... Tais versos só são compreensíveis e só têm graça se se sente o sistema geral da língua, e são quase intraduzíveis, como jogos de palavras." ********************************************************************** A FLAUTA VÉRTEBRA A todos vocês, que eu amei e que eu amo, ícones guardados num coração-caverna, como quem num banquete ergue a taça e celebra, repleto de versos levanto meu crânio. Penso, mais de uma vez: seria melhor talvez pôr-me o ponto final de um balaço. Em todo caso eu hoje vou dar meu concerto de adeus. Memória! Convoca aos salões do cérebro um renque inumerável de amadas. Verte o riso de pupila em pupila, veste a noite de núpcias passadas. De corpo a corpo verta a alegria. esta noite ficará na História. Hoje executarei meus versos na flauta de minhas próprias vértebras. (tradução: Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman) ********************************************************************** BLUSA FÁTUA Costurarei calças pretas com o veludo da minha garganta e uma blusa amarela com três metros de poente. pela Niévski do mundo, como criança grande, andarei, donjuan, com ar de dândi. Que a terra gema em sua mole indolência: "Não viole o verde de as minhas primaveras!" Mostrando os dentes, rirei ao sol com insolência: "No asfalto liso hei de rolar as rimas veras!" Não sei se é porque o céu é azul celeste e a terra, amante, me estende as mãos ardentes que eu faço versos alegres como marionetes e afiados e precisos como palitar dentes! Fêmeas, gamadas em minha carne, e esta garota que me olha com amor de gêmea, cubram-me de sorrisos, que eu, poeta, com flores os bordarei na blusa cor de gema! (tradução: Augusto de Campos) ********************************************************************** O AMOR Um dia, quem sabe, Ela que também gostava de bichos, apareça numa alameda do zoo, sorridente, tal como agora está no retrato sobre a mesa. Ela é tão bela, que por certo, hão de ressuscitá-la Vosso Trigésimo século ultrapassará o exame de mil nadas, que dilaceravam o coração. Então, de todo amor não terminado seremos pagos em enumeráveis noites de estrelas. Ressuscita-me, nem que seja porque te esperava como um poeta, repelindo o absurdo cotidiano! Ressuscita-me, nem que seja só por isso! Ressuscita-me! Quero viver até o fim que me cabe! Para que o amor não seja mais escravos de casamentos, concupiscência, salários. Para que, maldizendo os leitos, saltando dos coxins, o amor se vá pelo universo inteiro. Para que o dia, que o sofrimento degrada, não vos seja chorado, mendigado. E que ao primeiro apelo: - Camaradas! Atenta se volte a terra inteira. Para viver livre dos nichos das casas. Para que doravante a família seja o pai, pelo menos o universo; a mãe, pelo menos a terra. (1923) ********************************************************************* AMO COMUMENTE É ASSIM Cada um ao nascer traz sua dose de amor, mas os empregos, o dinheiro, tudo isso, nos resseca o solo do coração. Sobre o coração levamos o corpo, sobre o corpo a camisa mas isto é pouco. Alguém imbecilmente inventou os punhos e sobre os peitos fez correr o amido de engomar. Quando velhos se arrependem. A mulher se pinta. O homem faz ginástica pelo sistema Mulher. Mas é tarde. A pele enche-se de rugas. O amor floresce, floresce, e depois desfolha. ********************************************************************* GAROTO Fui agraciado com o amor sem limites. Mas, quando garoto, a gente preocupada trabalhava e eu escapava para as margens do rio Rion e vagava sem fazer nada. Aborrecia-se minha mãe: "Garoto danado!" Meu pai me ameaçava com o cinturão. Mas eu, com três rublos falsos, jogava com os soldados sob os muros. Sem o peso da camisa, sem o peso das botas, de costas ou de barriga no chão, torrava-me ao sol de Kutaís até sentir pontadas no coração. O sol assombrava: "Daquele tamainho e com um tal coração! Vai partir-lhe a espinha! Como, será que cabem nesse tico de gente o rio, o coração, eu e cem quilômetros de montanhas?" ********************************************************************* ADOLESCENTE A juventude de mil ocupações. Estudamos gramática até ficar zonzos. A mim me expulsaram do quinto ano e fui entupir os cárceres de Moscou Em nosso pequeno mundo caseiro brotam pelos divãs poetas de melenas fartas. Que esperar desses líricos bichanos? Eu, no entanto, aprendi a amar no cárcere. Que vale comparado com isto a tristeza dos bosques de Boulogne? Que valem comparados com isto suspirosante a paisagem do mar? Eu, pois, me enamorei da janelinha da cela 103 da "oficina de pompas fúnebres Há gente que vê o sol todos os dias e se enche de presunção. Não valem muito esses raiozinhos dizem. Eu, então, por um raiozinho de sol amarelo dançando em minha parede teria dado todo um mundo. ********************************************************************** MINHA UNIVERSIDADE Conheceis o francês sabeis dividir, multiplicar, declinar com perfeição. Pois, declinai! Mas sabeis por acasos cantar em dueto com os edifícios? Entendeis por acaso a linguagem dos bondes? O pintainho humano mal abandona a cascas atraca-se aos livro e as resmas de cadernos. Eu aprendi o alfabeto nos letreiros folheando páginas de estanho e ferro. Os professores tomam a terra e a descarnam e a descascam para afinal ensinar: "Toda ela não passa dum globinho!" Eu com os costados aprendi geografia. Os historiadores levantam a angustiante questão: - Era ou não roxa a barba de Barba Roxa? Que me importa! Não costumo remexer o pó dessas velharias. Mas das ruas de Moscou conheço todas as histórias. Uma vez instruídos, há os que se propõem a agradar às damas, fazendo soar no crânio suas poucas idéias,como pobres moedas numa caixa de pau. Eu, somente com os edifícios,conversava. Somente os canos respondiam. Os tetos como orelhas espichando suas lucarnas aguardavam as palavras que eu lhes deitaria. Noite a dentro uns com os outros palravam girando suas línguas de catavento. ********************************************************************* ADULTOS Os adultos fazem negócios. Têm rublos nos bolsos. Quer amor? Pois não! Ei-lo por cem rublos! E eu, sem casa e sem teto, com as mãos metidas nos bolsos rasgados, vagava assombrado. À noite vestis os melhores trajes e ides descansar sobre viúvas ou casadas. A mim Moscou me sufocava de abraços com seus infinitos anéis de praças. Nos corações, no bate o pêndulo dos amantes. Como se exaltam as duplas no leito do amor! Eu, que sou a Praça da Paixão, surpreendo o pulsar selvagem do coração das capitais. Desabotoado, o coração quase de fora, abria-me ao sol e aos jatos díágua. Entrai com vossas paixões! Galgai-me com vossos amores! Doravante não sou mais dono de meu coração! Nos demais - eu sei, qualquer um o sabe! O coração tem domicílio no peito. Comigo a anatomia ficou louca. Sou todo coração - em todas as partes palpita. Oh! Quantas são as primaveras em vinte anos acesas nesta fornalha! Uma tal carga acumulada torna-se simplesmente insuportável. Insuportável não para o versos de veras. ********************************************************************* O QUE ACONTECEU Mais do que é permitido, mais do que é preciso, como um delírio de poeta sobrecarregando o sonho: a pelota do coração tornou-se enorme, enorme o amor, enorme o ódio. Sob o fardo, as pernas vão vacilantes. Tu o sabes, sou bem fornido, entretanto me arrasto, apêndice do coração, vergando as espáduas gigantes. Encho-me dum leite de versos e, sem poder transbordas, encho-me mais e mais. ********************************************************************* CLAMO Levantei-me como um atleta, levei-o como um acrobata, como se levam os candidatos ao comício, como nas aldeias se toca a rebate nos dias de incêndio. Clamava: "Aqui está, aqui! Tomai-o!" Quando este corpanzil se punha a uivar, as donas disparando pelo pó, pelo barro ou pela neve, como um foguete fugiam de mim. - "Para nós, algo um tanto menor, algo assim como um tango... " Não posso levá-lo e carrego meu fardo. Quero arremessá-lo fora e sei, não o farei. Os arcos de minhas costelas não resistem. Sob a pressão range a caixa torácica. ********************************************************************* TU Entraste. A sério, olhaste a estatura, o bramido e simplesmente adivinhaste: uma criança. Tomaste, arrancaste-me o coração e simplesmente foste com ele jogar como uma menina com sua bola. E todas, como se vissem um milagre, senhoras e senhorias exclamaram: - A esse amá-lo? Se se atira em cima, derruba a gente! Ela, com certeza, é domadora! Por certo, saiu duma jaula! E eu júbilo esqueci o julgo. Louco de alegria saltava como em casamento de índio, tão leve, tão bem me sentia. ********************************************************************* IMPOSSÍVEL Sozinho não posso carregar um piano e menos ainda um cofre-forte. Como poderia então retomar de ti meu coração e carregá-lo de volta? Os banqueiros dizem com razão: "Quando nos faltam bolsos, nós que somos muitíssimo ricos, guardamos o dinheiro no banco". Em ti depositei meu amor, tesouro encerrado em caixa de ferro, e ando por aí como um Creso contente. É natural, pois, quando me dá vontade, que eu retire um sorriso, a metade de um sorriso ou menos até e indo com as donas eu gaste depois da meia-noite uns quantos rublos de lirismo à toa. ********************************************************************** O QUE ACONTECEU COMIGO As esquadras acodem ao porto. O trem corre para as estações. Eu, mais depressa ainda, vou a ti, atraído, arrebatado, pois que te amo. Assim como se apeia o avarento cavaleiro de Púchkin alegre por encafuar-se em seu sótão, assim eu regresso a ti, amada, com o coração encantado de mim. Ficais contentes de retornar à casa. Ali vos livrais da sujeira, raspando-vos, lavando-vos, fazendo a barba. Assim retorno eu a ti. Por acaso, indo a ti não volto à minha casa? Gente terrena ao seio da terra volta. Sempre volvemos à nossa meta final. Assim eu, em tua direção me inclino apenas nos separamos mal acabamos de nos ver. ********************************************************************* DEDUÇÃO Não acabarão com o amor, nem as rusgas, nem a distância. Está provado, pensado, verificado. Aqui levanto solene minha estrofe de mil dedos e faço o juramento: Amo firme, fiel e verdadeiramente. (1922) * = Antiga praça de Moscou, atual Praça Púchkin. A Propósito Disto * A Fé Distendei vossa espera o quanto quiserdes - tão clara, duma clareza tão alucinante é minha visão que, dir-se-ia, bastava o tempo de liquidar esta rima, para, grimpando ao longo do verso, entrar numa vida maravilhosa. Eu não preciso indagar o que e como. Vejo-o, nítido, até os último detalhes, no ar, camada sobre camada, como pedra sobre pedra. Vejo erguer-se, fulgurando no pináculo dos séculos, isento de podridões ou poeiras, o laboratório das ressurreições humanas. Eis o calmo químico, a vasta fronte franzida em meio à experiência . Num livro, "Toda a terra" procura ele um nome. "O Século Vinte...vejamos, a quem ressuscitar? A Maiacóvski talvez... Não, busquemos matéria mais interessante! Não era bastante belo esse poeta Será então minha vez de gritar daqui mesmo, desta página de hoje: "Pára, não folheies mais! É a mim que deves ressuscitar!" A Esperança Injeta sangue no meu coração, enche-me até o bordo das veias! Mete-me no crânio pensamentos! Não vivi até o fim o meu bocado terrestre , sobre a terra não vivi o meu'bocado de amor. Eu era gigante de porte, mas para que este tamanho? Para tal trabalho basta uma polegada. Com um toco de pena, eu rabiscava papel, num canto do quarto, encolhido, como um par de óculos dobrado dentro do estojo. Mas tudo que quiserdes eu farei de graça: esfregar, lavar, escovar, flanar, montar guarda. Posso, se vos agradar, servir-vos de porteiro. Há, entre vós, bastante porteiros? Eu era um tipo alegre, mas que fazer da alegria, quando a dor é um rio sem vau? Em nossos dias, se os dentes vos mostrarem não é senão para vos morder ou dilacerar. O que quer que aconteça, aflições, pesar... Chamai-me! Um sujeito engraçado pode ser útil. Eu vos proporei charadas, hipérboles e alegorias, malabares dar-vos-ei em versos. Eu amei...mas é melhor não mexer nisso. Te sentes mal? Tanto pior... Gosta-se, afinal, da própria dor. Vejamos... Amo também os bichos - vós os criais, em vossos parques? Pois, tomai-me para guarda dos bichos. Gosto deles. Basta-me ver um desses cães vadios, como aquele de junto à padaria, um verdadeiro vira-lata! e no entanto, por ele, arrancaria meu próprio fígado: Toma, querido, sem cerimônia, come! ********************************************************************* ESCÁRNIOS Desatarei a fantasia em cauda de pavão num ciclo de matizes, entregarei a alma ao poder do enxame das rimas imprevistas. Ânsia de ouvir de novo como me calarão das colunas das revistas esses que sob a árvore nutriz es- cavam com seus focinhos as raízes. (tradução: Augusto de Campos e Boris Schnaiderman) ********************************************************************* EU Nas calçadas pisadas de minha alma passadas de loucos estalam calcâneo de frases ásperas Onde forcas esganam cidades e em nós de nuvens coagulam pescoço de torres oblíquas só soluçando eu avanço por vias que se encruzilham à vista de crucifixos polícias (tradução: Haroldo de Campos) ********************************************************************* FRAGMENTOS 1 Me quer ? Não me quer ? As mãos torcidas os dedos despedaçados um a um extraio assim tira a sorte enquanto no ar de maio caem as pétalas das margaridas Que a tesoura e a navalha revelem as cãs e que a prata dos anos tinja seu perdão penso e espero que eu jamais alcance a impudente idade do bom senso 2 Passa da uma você deve estar na cama Você talvez sinta o mesmo no seu quarto Não tenho pressa Para que acordar-te com o relâmpago de mais um telegrama 3 O mar se vai o mar de sono se esvai Como se diz: o caso está enterrado a canoa do amor se quebrou no quotidiano Estamos quites Inútil o apanhado da mútua dor mútua quota de dano 4 Passa de uma você deve estar na cama À noite a Via Láctea é um Oka de prata Não tenho pressa para que acordar-te com relâmpago de mais um telegrama como se diz o caso está enterrado a canoa do amor se quebrou no quotidiano Estamos quites inútil o apanhado da mútua do mútua quota de dano Vê como tudo agora emudeceu Que tributo de estrelas a noite impôs ao céu em horas como esta eu me ergo e converso com os séculos a história do universo 5 Sei o puldo das palavras a sirene das palavras Não as que se aplaudem do alto dos teatros Mas as que arrancam caixões da treva e os põem a caminhar quadrúpedes de cedro Às vezes as relegam inauditas inéditas Mas a palavra galopa com a cilha tensa ressoa os séculos e os trens rastejam para lamber as mãos calosas da poesia Sei o pulso das palavras parecem fumaça Pétalas caídas sob o calcanhar da dança Mas o homem com lábios alma carcaça. (tradução: Augusto de Campos)

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Entrevista com Ney Matogrosso

Ney Matogrosso Ardente! Aos 65 de idade, o cantor Ney Matogrosso se despe de qualquer tipo de preconceito num bate-papo esclarecedor sobre sexualidade Eu não posso deixar de te contar uma coisa, Ney, já que vamos conversar sobre sexualidade. Um jornalista que trabalhava comigo numa revista costumava dizer: “Se eu descobrir que o meu filho é gay, eu coloco pra fora de casa”!!!!!... ... E ele vai transformar esse filho num marginal. Pra você ver o tamanho do amor desse pai pra esse filho. Ele comentava isso antes de a esposa engravidar. O filho nasceu e ele continuou afirmando a mesma coisa. Isso demonstra quem ele é: “adoooooooora” o filho. Coloca a expectativa dele na frente das necessidades do filho, se o filho tiver alguma. Mas é muito comum a gente ouvir: “Prefiro que meu filho seja ladrão do que ‘viado’ ”. Que ridículo! Quem fala isso é uma pessoa totalmente desinformada. Isso é ignorância. É uma pessoa que não tem nenhum esclarecimento mental. Quem falou isso é um jornalista! Mas ele é um ignorante. Eu não me conformava de ter que conviver no trabalho todo dia com uma pessoa que tinha uma cabeça tão pequena. Não tenho o mínimo preconceito, aliás, o meu melhor amigo e a minha melhor amiga são gays. Essa gente tem mentalidade antiga. Quando a pessoa coloca o filho pra fora de casa por causa da sua sexualidade, aí, sim, ele vai ser marginalizado, pode até se transformar num travesti. Nem tenho nada contra eles, mas acho que não deve ser uma vida fácil, de estar se prostituindo. É uma vida marginal. Eu acho que quase todos esses meninos que estão se prostituindo como travestis é porque foram expulsos de casa. Há exceções, claro. Você se declara homossexual, Ney? Eu já transei com muitas mulheres e com muitos homens. Eu acho que esse rótulo “homossexual” é muito recente, do final do século 19. Essa palavra não existia e ela se referia a homens que transavam com muitas mulheres. Quer dizer, “homem sexual, sexualidade masculina exacerbada, homossexual”... Não sei por que transformaram o sentido dessa palavra. Isso o que eu estou falando pra você, Cléo, é científico, não estou inventando. Homossexual, heterossexual, isso tudo é uma bobagem. É tudo sexualidade humana. Tudo isso são rótulos, é mais uma forma de manipulação, é uma palhaçada. Isso não interessa. O que importa é a liberdade de se expressar sexualmente. O ideal é que todo mundo se expresse livremente tanto com homens ou com mulheres, do jeito que bem entender. Acho que isso não deve ter nome. Como eu vou te perguntar isso? Estou completamente constrangida pelo respeito que eu tenho por você e pelo ser humano que você é... Enfim... Como você se enquadra sexualmente? Eu não me enquadro em nada. Sou uma pessoa muito sexualizada e manifesto a minha sexualidade da maneira que o momento permita (gargalhadas). Pára de rir, Ney. Assim, não consigo fazer a entrevista (risos). Mas o que eu vou falar pra você, Cléo? (gargalhadas). Falando sério, agora. Sei que eu sou rotulado como homossexual. Mas são as pessoas que me rotulam assim. Eu não me rotulo dessa maneira, eu não assumo nada, não assumo que eu tenha que ser de alguma maneira só porque as pessoas acham isso sobre mim. Sou um ser humano normal, como qualquer outro. E por que te rotulam? Porque eu admito que transo com homens. Só por isso. Não tenho porque esconder nada. Como a imprensa descobriu isso? Em 73, mais ou menos, me perguntaram e eu falei. O que acontecia era o seguinte: em 73, quando a imprensa conversava comigo sobre sexualidade, eu falava claramente sobre a MINHA sexualidade. Aí, quando eu lia a matéria, o texto era completamente diferente do que eu declarei, falava sobre o amor. E eu pensava: “Mas eu não falei nada sobre o amor, eu falei sobre sexo”. É que, naquela época, existia uma proibição de se tocar claramente sobre esse assunto porque estávamos na ditadura. Os jornalistas sabem alguma coisa sobre mim porque eu mesmo falei, nunca tive problemas em relação a isso. Eu tive problemas antes de resolver isso comigo mesmo. A partir do momento que eu resolvi, deixou de ser um problema. Você enfrentou quais os tipos de problemas com a sua sexualidade? Eu tinha muito medo disso, medo de transar com homens e virar um estereótipo. Aí, eu entendi que você pode transar com quem você quiser – com homem ou com mulher. Mulher com mulher, homem com homem – e não precisa virar nada. Esses estereótipos são muito chatos, tipo “mulher machona”, “homem “viadinho”... O mais atraente é você continuar a ser uma pessoa normal. Eu te conheço há tantos anos, Ney, há quase 30 anos! Cheguei a discutir com algumas pessoas por causa disso. É que a gente vê você no palco e, lá, você é outra pessoa. Conversando assim, frente a frente, você é completamente diferente. Eu achava que você fazia um tipo. Não, Cléo! (risos). Eu transo com homens, sim. Mas já transei com muitas mulheres. Neste momento, não transo mais com mulher. Inevitavelmente, a relação vira um romance. Não quero isso. Não quero me relacionar com ninguém que tenha que virar casamento. E com mulher é impossível você escapar disso. E todas elas querem casar. Até as mulheres mais loucas que eu conheci, as mais liberadas, no fundo, no fundo, elas queriam casar. Gosto de viver sozinho. Isso não significa que eu não possa ter um relacionamento com alguém, não possa ter pessoas com quem eu transe – mas eu não quero me casar mais, nem com homem nem com mulher. A não ser que caia um raio sobre a minha cabeça que me faça mudar de idéia. Pode acontecer! (risos). Na primeira entrevista que eu fiz com você, em 79, eu tinha 19 anos. Você comentou de uma filha sua que teria hoje dois anos a menos que eu. Supostamente, Cléo. Essa filha apareceu e eu falei pra ela: “Vamos fazer um teste de DNA”. Ficou comprovado que eu não sou o pai dela. Se existe alguma filha que eu tenho, está perdida no mundo e eu desconheço. Como a sua família reagiu diante da sua sexualidade? Seus pais eram preconceituosos? Meu pai era militar, só pra você ter uma idéia. Mas eu assumi minha sexualidade num momento em que eu já estava fora de casa há muito tempo e era dono do meu próprio nariz, vivendo às minhas custas. Eu não tinha que pedir licença nem dar satisfação pra ninguém. Meu pai tocou nesse assunto uma única vez. Sabe qual foi o choque dele, Cléo? Nem imagino. Meu pai via que na minha casa tinha um trânsito de homens e mulheres. Ele ficou muito incomodado e me disse: “Você tem que se definir, está errado não se definir”. Eu falei pra ele que eu não precisava me definir em nada, que não tinha nada de errado. Fiquei chocado de o meu pai achar que o erro era eu não me definir sexualmente. Eu achei que o meu pai iria ficar grilado pelo fato de eu transar com homens, não de eu não ser definido. Se você gosta de transar com homem e mulher já está definido, não é? Foi a única vez que tocamos nesse assunto. E como a sua mãe reagiu? Não faço a menor idéia, nunca perguntei! Ela nunca me disse nada e eu também não. Minha mãe nunca teve problemas com relação a isso e ela conheceu várias pessoas com quem eu namorei. Nunca vi sequer torcer o seu nariz. Meu pai também não. Uma vez ele foi ao Rio de Janeiro e eu namorava um judeu. Meu pai sempre teve admiração pelo povo judeu. Quando eles se conheceram, ele ficou íntimo amigo do meu namorado. Eu achava aquilo tão estranho! Eu pensei que meu pai não iria aceitar o contato com uma pessoa que ele sabia que tinha uma história comigo. E ficou íntimo amigo... O que os pais devem fazer ao descobrir que o filho é gay? Eu acho que você tem que acolher uma pessoa que você ama, independente da circunstância. Se você ama uma pessoa, você precisa acolher, ser um apoio pra ela em qualquer situação. Isso é um princípio humano, não é só na relação entre pai e filho. Até se a pessoa se transformar num marginal, num assassino, você precisa ser a sua estrutura e ser um apoio pra ela. Estou falando até num extremo exagerado. Eu tenho uma curiosidade. Como a homossexualidade desperta na pessoa? Porque existem várias teses: a pessoa nasce assim, é a convivência com outras pessoas, é uma doença... Desde a minha infância eu sabia que eu era uma criança diferente. Só que eu não sabia o que era. Meus amigos eram extrovertidos e eu era introvertido, eu era hipersensível, tinha dons artísticos. O grande problema com o meu pai era esse. Ele percebia que eu era um menino diferente. Eu não tinha consciência de que isso significasse alguma coisa. Pra mim, eu era daquele jeito. Só fui entender muito tempo depois, já na adolescência, que isso tinha a ver com atração por pessoas do mesmo sexo. Não fui um adolescente namorador. A minha primeira relação sexual foi aos 13 anos e foi com uma mulher – e eu gostei. Não tive nenhum trauma. Você me perguntou como isso desperta na pessoa. Eu acho que a gente nasce assim. Mas eu sempre me entendi diferente. E você é a mesma pessoa até hoje desde quando eu te conheci. Sim, sou exatamente a mesma pessoa que eu me entendi quando eu tinha cinco ou seis anos de idade. Eu sou aquele. Só que, com o passar do tempo, fui me permitindo experimentar coisas novas. Na verdade, a minha sexualidade despertou depois que eu me tornei artista. Antes, eu passava até dois anos sem transar com ninguém. Eu não tinha essa sexualidade aflorada. Liberei depois dos 30 anos. O palco colaborou pra isso? O palco foi um estimulador. Na medida em que eu liberava isso pras pessoas, isso passou a ser uma verdade pra mim. Eu já te perguntei isso uma vez, mas acho bacana ressaltar. Comentei como chega aos seus ouvidos as pessoas gritarem “gostoso” durante o seu show, tanto homem quanto mulher. Você respondeu que estimula a sexualidade nas pessoas. A minha manifestação no palco estimula mesmo a sexualidade nas pessoas. Isso eu ouço delas, não é uma tese minha. Recebo cartas me dizendo isso, de pessoas de muita idade comentando que isso não existia mais na vida delas e que, depois de me verem no palco, reconhecem que a sexualidade faz parte da vida delas. Fico feliz de poder mostrar pras pessoas que elas estão vivas. Agora, como elas vão resolver, não é um problema meu. Uma cena interessante que eu presenciei em um dos seus shows aqui em São Paulo, o Vagabundo, foi uma mulher casada largar o marido na mesa pra te levar um cartaz... Ela gritava “gostoso” na frente do palco, e o marido ficou lá na mesa, sozinho... Eu acho que os maridos não devem ter ciúme disso – muitos maridos têm e são grilados. Não vai acontecer nada. Aquilo lá, que elas consideram “gostoso” , é uma sereia, aquilo não existe – dura uma hora e meia e desaparece. Quando eu saio do palco, não sou aquele, não sou aquilo. Não tenho necessidade daquilo. Em relação ao que você falou, de homens e mulheres gritarem “gostoso” pra mim, eu emano essa sexualidade, mas indistintamente. Você falaria sobre o Cazuza? Eu falo do Cazuza, sim, sempre falei do Cazuza. Quanto tempo vocês ficaram juntos? Foram só três meses, mas muuuuuuuuito intensos. E ficamos pro resto da vida juntos, como amigos. O Nélson Motta escreveu no livro dele que eu fiquei com o Cazuza quando ele era cantor – não foi nada disso. Minha história com o Cazuza aconteceu em 79, ele não era nem artista, era fotógrafo da gravadora Som Livre. Foram três meses de relacionamento com labaredas de dois metros de altura. Mas acabou e a gente nunca mais se afastou. Sempre fomos amigos, não houve aquele mês de separação. Nossa! Eu achava que você tivesse ficado com ele numa época mais pra frente. As pessoas deturpam tudo. No livro do Nelsinho, ele justifica que eu gravei a música Pro Dia Nascer Feliz porque eu era apaixonado pelo Cazuza. E não era nada disso – eu gravei porque eu tinha admiração pelo Cazuza e porque a música era ótima. Fui apaixonado por ele em 79 (fomos apaixonados, foi recíproco). Eu assisti ao filme Cazuza. Cadê você no filme, Ney???? É a pergunta que todos fazem e que a diretora e o produtor do filme devem responder. A diretora foi na minha casa e eu contei tudo pra ela – desde o momento em que eu conheci o Cazuza até o último dia em que a gente se viu. Falei de toda a nossa trajetória. Sei lá, disseram pra mim que eu era um personagem tão grande que não cabia em apenas duas entradas do filme. O que eu vou fazer? Cortar meus pulsos? (gargalhadas). Mas não tem sentido sequer mencionar seu nome no filme, Ney. Não tem sentido mesmo. O Cazuza morreu porque era portador do vírus HIV. Como você consegue preservar a sua saúde? Hoje, existe a camisinha, mas na época fui poupado e não sei por que razão. Isso não tem explicação. Eu pergunto pros médicos qual a explicação pra isso e ninguém me dá uma resposta. Não existem aquelas prostitutas africanas, que transam com todo mundo e não adquirem a doença? Eu não sei o que acontece comigo. A partir do momento em que eu soube da existência da Aids, no primeiro teste que eu fiz e vi que não era portador da doença, passei a usar camisinha. Mas, antes, a camisinha era usada apenas pra não procriar e, mesmo assim, pouquíssimas pessoas usavam. Uso que a igreja católica inclusive condena... A igreja católica é ridícula.

a águia e a galinha II